Era uma vez uma linda princesa, que vivia no alto de uma torre protegida por um terrível dragão. Ela passava os dias a contemplar seus sedosos cabelos perante o espelho, e a sonhar com a chegada de seu príncipe. Para ela, pouco importava o tempo que seu bravo herói demorasse para buscá-la, pois sabia que esse seria um momento tão especial e único de sua vida, que poderia aguardar sem pressa o seu tão esperado final feliz.
Um dia, de repente, seu príncipe chegou. Ficou tão emocionada ao ouvir seus gritos de luta com o dragão que mal conseguia raciocinar. Durante a maior parte de sua vida ela não havia feito nada além de desejar esse momento, como se esse fosse o ponto inicial de toda a sua felicidade, logo, até aí, não sabia ao certo o que era realmente esse sentimento.
Quando seu amado entrou pela porta sentiu pela primeira vez na vida a frustração, contrapondo-se totalmente a felicidade que esperava, pois ele não passava de um baixinho gorducho com cara de sapo, e além da sua cara havia um fedor muito semelhante a de quem vive em uma pântano. Talvez ela precisasse beijá-lo para que ele se tornasse um príncipe, e assim fez. Porém, não, ele não se tornou um príncipe. A mesma feiurinha que entrou por aquela porta permaneceu ali, e o que estava ruim ficou pior, visto que ele abriu a boca deixando aparente a ausência de alguns dentes e a falta de higiene de outros.
Tudo bem, conformou-se , porque apesar da aparência dele não ser tão agradável assim, era bom finalmente ter a companhia de alguém. Desceram juntos da torre e foram em direção ao seu reino, e mais uma novidade reascendeu os seus olhos, a miséria do povo. Ocorreu nela uma confusão de sentimentos; o surreal misturava-se com o desgosto, que ao mesmo instante despertava-lhe interesse. Toda aquela pobreza, toda aquela sujeira, o barulho, o cheiro, o feio, tomaram toda a sua atenção. E foi assim que ela descobriu que passou toda a sua vida de olhos fechados, não sendo nada além de uma bela adormecida. Bela não, de uma falsa adormecida.
Todos esses anos em que se escondeu em sua fortaleza serviram-lhe apenas para demonstrar o tão egoísta e mesquinha foi, o tanto de tempo que preferiu fingir não enxergar, simplesmente para não se importar, ao ter que acordar e enfrentar toda a realidade que seu dragão podia camuflar. Ela sentiu vergonha, ela sentiu nojo de si, e dessa vez resolveu mudar.
Pegou a mão daquele que lhe salvou, e prometeu sua fidelidade a ele de joelhos, de modo que jamais imaginou ser capaz de se comportar. Porque, apesar da natureza dos homens não ter sido tão generosa com ele, a natureza dos deuses foi. Além de ele a salvar da torre, ele a salvou da morte, da morte de não viver, ou viver de olhos fechados, ou até de sufocar-se com seu egocentrismo. E a partir de então ela descobriu o que era viver, e o que era ver, ver o mundo, tentar entender o mundo, e, então, poder conviver.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário